quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Caio Fernando Abreu

É Caio Fernando, caso você estivesse vivo hoje, eu certamente correria até você. Iríamos beber em qualquer bar sujo, e eu diria que nos últimos tempos, e só nos últimos tempos, eu passei a entender cada vírgula sua.
Eu diria que hoje eu entendo cada vírgula, e que elas me encorajam a botar fogo no apartamento ou abrir o gás e ir dormir. Você diria qualquer coisa bonita e triste, daquelas verdades que sangram. E eu dormiria reconfortada, sabendo que o mundo não está tomado por idiotas.
Mas você morreu há tanto tempo e não vai me dizer nada.

Então eu reproduzo trechos de você:

"Não choro mais. Na verdade, nem sequer entendo porque digo mais, se não estpu certo se alguma vez chorei. Acho que sim, um dia. Quando havia dor. Agora só resta uma coisa seca. Dentro, fora."

"Frágil – você tem tanta vontade de chorar, tanta vontade de ir embora. Para que o protejam, para que sintam falta. Tanta vontade de viajar para bem longe, romper todos os laços, sem deixar endereço. Um dia mandará um cartão-postal de algum lugar improvável. Bali, Madagascar, Sumatra. Escreverá: penso em você. Deve ser bonito, mesmo melancólico, alguém que se foi pensar em você num lugar improvável como esse. Você se comove com o que não acontece, você sente frio e medo. Parado atrás da vidraça, olhando a chuva que, aos poucos começa a passar."

"Talvez um voltasse, talvez o outro fosse. Talvez um viajasse, talvez outro fugisse. Talvez trocassem cartas, telefonemas noturnos, dominicais, cristais e contas por sedex (...) talvez ficassem curados, ao mesmo tempo ou não. Talvez algum partisse, outro ficasse. Talvez um perdesse peso, o outro ficasse cego. Talvez não se vissem nunca mais, com olhos daqui pelo menos, talvez enlouquecessem de amor e mudassem um para a cidade do outro, ou viajassem junto para Paris (...) talvez um se matasse, o outro negativasse. Seqüestrados por um OVNI, mortos por bala perdida, quem sabe. Talvez tudo, talvez nada."

"Penso, com mágoa, que o relacionamento da gente sempre foi um tanto unilateral, sei lá, não quero ser injusto nem nada - apenas me ferem muito esses teus silêncios."

Caio Fernando Abreu


Um comentário:

  1. Se estivesse aí juro que te raptava para nossa terrinha mardita só para te apertar, discutir filosofia barata de vida e ficar relembrando o passado escolar como uma velha chata. Hj tava falando pros meus coleguitas como no Brasil chamamos de neguinho as pessoas q amamos, e q isso não é desrespeito...rsrs
    Mas pensei bem, na verdade não é assim. Só existe uma neguinha, a Nêga do meu coração. Adoro vc, inclusive seu lirismo, mesmo q triste. Amo minha neguinha, saudade.

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